Decisão do STF é questionável


A abertura de inquérito para apurar eventuais fake News em desfavor de membros do Supremo Tribunal Federal, foi alvo de repúdio por parte do mundo acadêmico e jurídico. Tentaremos neste artigo explicar em palavras triviais, o porquê de tanta celeuma.

Cumpre-nos de logo, explicitar o que inseriu o legislador por ocasião da promulgação da CF/88 (art.129, I) no tocante ao Órgão do Ministério Público. Numa breve interpretação gramatical, o legislador constituinte de 1988, colocou o MP como titular da ação penal pública, salvo raríssimas exceções que não constituem objetivo deste.

O processo Penal brasileiro, agasalhou em seu bojo o chamado sistema acusatório em contraposição ao sistema inquisitivo. Queremos dizer com isto que a sistemática processual brasileira, respaldada pela Constituição de 1988, dividiu as funções dentro do complexo processo penal, a saber: à Polícia Judiciária ficou a incumbência de investigar crimes, delitos ou contravenções; ao Ministério Público interpor a ação penal pública, além de atuar como custos legis (fiscal da lei); por fim, ao Judiciário o julgamento das infrações penais, isto obviamente falando dentro do aspecto do processo penal.

É interessante destacar que nosso Código de Processo Penal, data de 03 de outubro de 1941. Todavia, este próprio Código sofreu diversas alterações como as de 2008, e para nosso interesse especificamente a lei 12.403/2011 que deixou nítida a intenção do legislador de tornar o juiz equidistante da investigação, quando altera o art. 312 do CPP, vedando ao juiz decretar a prisão preventiva no curso da investigação policial de ofício, podendo tão somente a requerimento do MP, do querelante ou por representação da autoridade policial. Demonstrou o legislador de 2011, que o juiz deve estar distanciado do procedimento investigatório, para que após o ingresso da ação penal e seu recebimento, esteja completamente imparcial.
Na abertura de investigação pelo Supremo Tribunal Federal para apurar as fake News, entendemos que a Suprema Corte se utilizou do art. 43 do regimento interno da casa, que afirma que poderá ser instaurado inquérito, por intermédio do Presidente do STF, nos crimes cometidos dentro da respectiva casa. Visualiza-se aí uma chamada interpretação extensiva de uma determinada legislação, no caso em espécie o regimento interno citado.

Em nosso parco entendimento, o STF criou com sua decisão um verdadeiro embrólio jurídico, ou seja, o órgão que determinou a investigação, “se confunde” com o órgão que irá julgar. Tal decisão destoa por completo com o nosso sistema acusatório que subdivide as funções de investigar, propor a ação penal e julgar.

Imaginem os leitores a hipótese no convívio social da vítima julgando o acusado. A assertiva é simplória, mas serve como paradigma para exemplificar o que de fato está ocorrendo com o Supremo Tribunal Federal, a vítima ou as vítimas julgando os acusados. Diante disto, poderia indagar o leitor qual o procedimento correto que deveria ser adotado pelo STF, em eventuais supostos crimes cometidos contra ele STF? A resposta já foi dada nos parágrafos anteriores, ou seja, diante da situação em concreto, o Presidente da Corte Suprema enviaria ofício à Procuradoria Geral da República, com documentos acostados, para que esta tomasse as providências legais. E qual ou quais as providências legais? Diante de elementos em mãos da Procuradora Geral da República esta teria as seguintes opções: requisitar à Polícia Federal investigação do fato ora imputado; promover a ação penal, acaso tivesse os elementos necessários para tal, e por fim requerer o arquivamento do inquérito quando inexistente a prova do crime ou indícios suficientes de autoria.

No entanto, a Suprema Corte brasileira, por intermédio de seu presidente Ministro Dias Tofóli, instaurou procedimento ex officio (de ofício) e nomeou o Ministro Alexandre de Moraes na condição de relator do procedimento. Ressalte-se que a presidência do STF, para tomar esta decisão unilateral avocou o artigo 43 do regimento interno da casa, que diz textualmente: “ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal, o presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro ministro”.

Vejam as senhoras e os senhores, que não há necessidade de uma interpretação teleológica, para se chegar à conclusão do que quer dizer o referido artigo e repito: “ ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal”… vejam que, numa análise simplória e gramatical, o artigo delimita a competência de apuração de ofício ás infrações cometidas na sede ou dependência do próprio STF. E aqui, repito não há necessidade de um estudo hermenêutico para saber que no caso em exame o Presidente do Supremo Tribunal Federal, não poderia invocar dito dispositivo para apurar eventuais infrações, em desfavor dos componentes da Corte Suprema.

Por fim, deixemos aqui consignado, que nenhuma instituição está imune as críticas do cidadão, obviamente cada um respondendo pelo excesso cometido, isto dentro do devido processo legal.

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