Cidades podem escolher comida saudável que ainda protege o meio ambiente


Essa é a proposta que faz o Governo Federal, com a Estratégia Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional nas Cidades. Trabalho conjunto de ministérios já planta ações pelo País

No último dia 22 de julho, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) publicou portaria que coloca 18 municípios do Rio Grande do Sul, todos sujeitos a intempéries iguais à que vitimou o estado no ano passado, como prioritários na implementação da Estratégia Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional nas Cidades – Alimenta Cidades.

O projeto pressupõe uma série de ações que estimulam a criação de hortas urbanas e periurbanas – regiões periféricas, próximas a áreas rurais – como frentes de produção de alimentos saudáveis, mais baratos e cujo cultivo ainda tem o condão de proteger as cidades de deslizamentos e outras manifestações destrutivas das mudanças climáticas.

Esse modelo é proposto às prefeituras, e a adesão é voluntária. Apesar de essa portaria do MDS ser recente, as ações que pretende estimular não são novas, e experiências do tipo já estão em curso pelo Brasil. Qualquer bom observador já notou a existência de plantios urbanos em terrenos sob linhas de transmissão de energia ou nas franjas das cidades.

A diferença do plano atual do Governo é reconhecer formalmente essas atividades já existentes e as demais que ainda vão surgir, permitindo aos produtores o acesso a políticas públicas de assistência técnica e financiamento subsidiado, semelhantes às que têm outros estabelecimentos agrícolas.

Em conjunto com as prefeituras e entidades da sociedade civil, como universidades, ONG’s e movimentos sociais, o projeto prevê também articulação para a venda e distribuição das hortaliças, legumes, temperos e ervas produzidas. O Alimenta Cidades pressupõe que essas hortas tenham escala de produção superior à de pequeninos cultivos domésticos, ou mesmo coletivos, voltados ao abastecimento pessoal.

Experiência o Governo Federal tem. Ações como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que garante a compra de alimentos – não apenas vegetais, mas também de origem animal – produzidos pela agricultura familiar para abastecer a merenda escolar e cozinhas hospitalares, são complementadas por outros programas, como as cozinhas solidárias.

Mecanismos como a garantia de compra das safras, que o Executivo já coloca em cena em momentos de dificuldades conjunturais, são outros exemplos de apoio estatal à disposição.

Leia a portaria do MDS publicada em 22 de julho

Essa estrutura de políticas públicas envolve diferentes ministérios e são reguladas por legislações específicas, que, no entanto, são permeáveis umas às outras. Todas podem se articular com a recém-lançada Estratégia Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional nas Cidades. É o que propõe o Governo.

Proteção natural

Na cidade de Nova Friburgo, a 141 quilômetros da capital Rio de Janeiro, um projeto de hortas urbanas e periurbanas está sendo desenvolvido desde que o município emergiu da tragédia climática de 2011. Entre aquele período e o final de 2024, o projeto teve apoio formal da Embrapa Agrobiologia, da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio de Janeiro (Emater-RJ ), de três universidades públicas e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq ), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

O primeiro objetivo do projeto era contribuir para o uso e proteção das encostas e áreas próximas a cursos de água, de forma a torná-las mais resistentes aos impactos de chuvas intensas e permeáveis à subida dos rios. A cobertura vegetal faz o papel de contenção natural aos deslizamentos e a ampliação de áreas ribeirinhas livres de concreto e asfalto, o de absorção das águas. Esses princípios compõe aquilo que se convencionou chamar Soluções baseadas na Natureza (SbN).

Segundo a Embrapa, as SbN fornecem simultaneamente benefícios ambientais, sociais e econômicos, com grande potencial para aumentar a resiliência de áreas mais vulneráveis a eventos climáticos de grande magnitude.

Conheça a lei que institui a Política Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana

Em Nova Friburgo, em parte como reflexo do projeto capitaneado pela Embrapa e, em grande parte, como continuidade da vocação rural do município, hortas urbanas e periurbanas estão em pleno funcionamento, algumas por iniciativa de organizações da sociedade civil. Geram emprego, renda e ainda se prestam a atender parcelas da comunidade que têm demandas específicas, como é o caso da horta construída por alunos do Colégio Estadual Agrícola Rei Alberto I, que fornece alimentos a pessoas com diabetes.

Novas práticas

A cidade serrana já tem tradição no plantio de verduras e hortaliças, o que contribui para a implementação de projetos do gênero. Nova Friburgo tem na produção e venda de tomate, coentro, brócolis, alface, couve-flor, repolho e salsa importante fonte de renda. As unidades de plantio lá existentes não passam de 20 hectares, segundo levantamento de pesquisadores da Embrapa. 70% das propriedades são da agricultura familiar.

A prevenção aos desastres naturais em Nova Friburgo envolvem investimentos em outras frentes, indispensáveis, como obras de drenagem e contenção de encostas. Mas o projeto de hortas periurbanas e urbanas mostra mudanças importantes já incorporadas ao dia-a-dia dos agricultores. Segundo pesquisa de Gerson José Yunes Antonio, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, e Renato Linhares de Assis, da Unicamp, quando questionados sobre práticas adotadas para preservação do ambiente:

• 100% dos agricultores citaram a manutenção de córregos/rios limpos
• 98% a preservação da vegetação nativa
• 89% o uso de sistemas de irrigação com menor demanda de água
• 85% a adoção e manutenção de sistema de esgotamento sanitário
• 70% a preservação da diversidade de espécies e variedades cultivadas
• 68% a adoção de práticas agroecológicas
• 66% a utilização de adubos orgânicos adequadamente compostados
• 43% a utilização de corretivo e adubo químico natural, obtidos da moagem da rocha original, com recomendação técnica
• 34% a utilização de práticas de conservação de solo.

Os dois pesquisadores destacam outros projetos semelhantes ao da Embrapa que auxiliam os produtores locais a mudar procedimentos e usar métodos mais sustentáveis, especialmente após a tragédia de 2011, em que chuvas torrenciais castigaram toda a região serrana do Rio.

Samba na cozinha

O compositor e cantor Zeca Pagodinho também planta essa ideia. Em agosto do ano passado, o instituto que leva o nome do artista fechou parceria com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) para impulsionar a produção e distribuição de comida orgânica no município de Xerém.

Com o apoio da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), o objetivo do projeto é capacitar a comunidade em agricultura urbana e periurbana, beneficiando diretamente cerca de 100 famílias. 

“O Zeca Pagodinho empresta o seu prestígio para que todo o país possa replicar experiências como essa e, em breve período, nós consigamos tirar o povo brasileiro do mapa da fome, ter a comida farta na mesa do povo, comida de qualidade, recuperando a cultura alimentar do povo brasileiro”. disse o ministro Paulo Teixeira à época em que a parceria foi firmada.

O que espera o MDS

O programa Alimenta Cidades, do MDS, veio à luz com a portaria 972, de 26 de março de 2024. Nela, o ministério define as linhas gerais do projeto e aponta que parte das responsabilidades por sua implementação cabe aos municípios. Especialmente porque, segundo o MDS, são as administrações e as populações locais que têm o conhecimento e as ferramentas mais adequadas para transformar ideias em ações.

Diz o portal do MDS: “Garantir o acesso a uma alimentação saudável e adequada implica ações integradas e transversais com a participação dos territórios periféricos no planejamento das ações pela segurança alimentar e nutricional nas cidades, incorporando a memória de seus moradores e os ativos sociais culturais e organizativos desses territórios”.

Há outra razão apontada pelo MDS. Garantir participação social equivale a manter controle sobre procedimentos e resultados de maneira mais eficaz e duradoura. Eficaz, porque, conjugado com os poderes públicos, o olhar das organizações sociais e moradores propiciam maior transparência. Já a incorporação das metas, princípios e práticas por parte da população tende a fazer o programa sobreviver a mudanças de comando na administração das cidades.

A portaria de março do ano passado estipulou um primeiro grupo de 59 municípios prioritários para a implementação do Alimenta Cidades, de Norte a Sul do País. Segundo o MDS, “a proposta foi elaborada em consonância com o Planejamento Plurianual do Governo Federal (PPA 2024-2027), no Planejamento Estratégico do MDS e no Plano Brasil Sem Fome”.

Ainda no portal do MDS, destaque para a interseção do Alimenta Cidades com outras iniciativas governamentais, “especialmente a Política Nacional de Abastecimento Alimentar; o Programa Cozinha Solidária; o Programa Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana; o Plano Clima – Adaptação e Mitigação e as ações de promoção da alimentação adequada e saudável no ambiente escolar.”

Até então, a julgar pela tônica dada pelo ministério, o principal objetivo era a conquista de soberania e segurança alimentares nas cidades, a partir da ações desenvolvidas nos próprios territórios. Isso continua, mas, a partir da portaria publicada na última terça-feira (22/7), a perspectiva ambiental ganha maior relevância. No segundo parágrafo do artigo primeiro, o texto diz: “No estado do Rio Grande do Sul, a implementação da Estratégia será direcionada, prioritariamente, à agenda climática, em observância à sua interface com a agenda de alimentação urbana.”

Fonte: GOV.BR

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